Banimento das plataformas digitais.

A economia digital revolucionou a interação do mercado com os consumidores. Com a seleção de critérios que medem a satisfação do cliente com o produto ou serviço adquirido, as plataformas digitais aprendem com as avaliações e aprimoram-se para no próximo atendimento superar a expectativa do seu cliente.

Mas existe o outro lado desta mesma moeda. Quando o cliente avalia o serviço ou o produto adquirido em uma plataforma digital, ele não está avaliando apenas a corporação (Uber, 99, Ifood, Mercado Livre, etc), também está avaliando o serviço ou o produto que foi intermediado pela plataforma digital.

As avaliações em 5 estrelas parecem tão banais, que o consumidor perde a noção do significado que pode ser dado para aquela nota. No ranking dos usuários das plataformas digitais, uma única estrela tem um grande impacto no número de produtos ou serviços que aquele usuário pode comercializar, pode até causar a rescisão do contrato firmado entre vendedor e plataforma.

Não são raros os motoristas de aplicativos, entregadores de comida, ou até mesmo os vendedores de marketplaces que são banidos por avaliações dos clientes. Nem sempre a avaliação que motivou a rescisão unilateral do contrato (banimento da plataforma) é relacionada a prestação do serviço ou ao fornecimento do produto.

Ocorre que as corporações que estão por tras da gestão das plataformas digitais não disponibilizam aos usuários uma justificativa que expresse a motivação ou a causa da rescisão unilateral do contrato. Por isso é comum que os usuários das plataformas busquem no poder judiciário a transparência das razoes que ensejaram em seu banimento.

O sistema jurídico brasileiro alberga o direito de o usuário conhecer a real motivação do banimento (rescisão do contrato) da plataforma.

O Marco Civil da Internet (lei nº 12.965/2014) garante a parte interessada o acesso a informações com proposito probatório, desde que o solicitante apresente: i) indícios da ocorrência de algum ilícito; ii) justificativa motivada da utilidade dos registros solicitados para fins de investigação ou instrução probatória; iii) período ao qual se referem os registros.

Assim, caso a justificativa apresentada pela plataforma digital seja insuficiente para apurar o motivo que levou ao banimento, é possível pleitear as informações pela via judicial. Diversos tribunais mantem sua jurisprudência alinhada ao direito do usuário da plataforma, fundado no princípio da boa-fé contratual, em conhecer a real motivação da rescisão contratual.

DIREITO CIVIL. PROCESSO CIVIL. PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS. ART. 381 CPC. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHA. REJEITADA. FORNECIMENTO DAS RECLAMAÇÕES DOS CLIENTES ACERCA DE MAU COMPORTAMENTO DO MOTORISTA DA UBER COM PRESERVAÇÃO DA IDENTIDADE DOS CLIENTES. POSSIBILIDADE. 1. O artigo 381 do CPC possibilita a produção antecipada da prova nos casos em que I – haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação; (…) e III – o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação. 2. Como o contrato firmado entre as parte prevê, de forma expressa, penalidades para o caso de certas condutas e tendo a parte autora, colacionado provas de que teria cumprido as obrigações que lhe competiam, em homenagem aos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato, da transparência e do dever de informação, impõe-se que a parte apelada atenda o pleito vindicado, exibindo as razões da rescisão, posto que o silêncio enseja presunção de rescisão imotivada. 3. Recurso conhecido e provido. (TJ-DF 07345308720188070001 DF 0734530-87.2018.8.07.0001, Relator: CARLOS RODRIGUES, Data de Julgamento: 23/10/2019, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no PJe: 14/11/2019 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

Conhecer o fato que motivou a rescisão contratual é importante para os dois polos contratuais, seja para a plataforma digital ou para o usuário banido, pois o contrato que é firmado entre as partes  prevê penalidades distintas para cada espécie de conduta. A apuração de responsabilidade civil por danos decorrentes da rescisão unilateral do contrato também se embasará no fato que motivou a rescisão.

Por isso, é obrigação da plataforma digital disponibilizar aos usuários banidos a real motivação do banimento (rescisão unilateral do contrato). Caso a plataforma não disponibilize informações suficientes para motivar a rescisão unilateral, assim como na jurisprudência citada, o usuário poderá  requerer em esfera judicial que a plataforma apresente provas dos fatos que motivaram o banimento e, se estes forem incompatíveis com as clausulas contratuais, o acesso do usuário poderá ser reestabelecido.